28 janeiro 2007

A missão da Igreja Cristã

A Igreja necessita resgatar o discipulado como uma prática normal em contraste com a filosofia pluralista. Tanto um conceito, como uma prática correta de discipulado evidenciará a saúde espiritual da Igreja. O pastor Dietrich Bonhoeffer notou que "em tudo que segue, queremos falar em nome de todos aqueles que estão perturbados e para os quais a palavra da graça se tornou assustadoramente vazia. Por amor a verdade, essa palavra tem que ser pronunciada em nome daqueles de entre nós que reconhecem que, devido à graça barata, perderam o discipulado de Cristo, e, com o discipulado de Cristo, a compreensão da graça preciosa. Simplesmente por não querermos negar que já não estamos no verdadeiro discipulado de Cristo, que somos, é certo, membros de uma igreja ortodoxamente crente na doutrina da graça pura, mas não membros de uma graça do discipulado, há que se fazer a tentativa de compreender de novo a graça e o discipulado em sua verdadeira relação mútua. Já não ousamos mais fugir ao problema. Cada vez se torna mais evidente que o problema da Igreja se cifra nisso: como viver hoje uma vida cristã."[1]

Este é o modelo Bíblico onde é possível desenvolver o caráter de Cristo na vida dos envolvidos. Conhecer a Deus por meio de Jesus, e glorifica-lo num relacionamento construtivo como Igreja. Nesse relacionamento construtivo o alvo é preparar discípulos para um envolvimento nos ministérios e departamentos da igreja, proporcionando um fortalecimento qualitativo, que resultará naturalmente na multiplicação de outros discípulos. John Sittema nos lembra que discipular é “reproduzir a si mesmo e sua fé na vida de outros.”[2] Evidentemente não podemos confundir, porque o Senhor Jesus exige que façamos discípulos dele e não nossos. Novamente podemos citar Sittema observando que “esse processo requer o desenvolvimento de um relacionamento de confiança, de exemplo, de revelação do nosso coração e da nossa fé ao discípulo que, por sua vez deve imitar o padrão de fé do seu mestre.”[3]

A Igreja não é testemunha de si mesma. Os salvos são chamados para proclamar a soberana graça do redentor. A Palavra de Deus como meio de graça para alcançar e transformar o pecador é o intrumento do Espírito Santo. A Igreja não prega um misticismo irracional, nem mesmo supostas novas revelações, mas ela instrui a Escritura Sagrada que “é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Tm 3:16). O conteúdo registrado na Escritura Sagrada não é o resultado da experiência evolutiva dos povos antigos, mas a auto-revelação do Deus de Israel. W. Gary Crampton observa que "a concepção ortodoxa da inspiração também declara que a revelação bíblica é proposicional em natureza; ela ensina uma verdade proposicional. Proposições são lógicas, com importantes combinações de palavras que declaram alguma coisa. Elas possuem o significado das sentenças declaradas. A verdade da Escritura não está 'em meio', 'acima', ou 'além' das palavras, ou somente na mente do intérprete. Nem estão as palavras secretamente simbolizadas, insinuando alguma verdade mais "elevada" ou "profunda". Pelo contrário, a verdade de Deus repousa no significado lógico e organização que as palavras possuem. Nem numerologistas, nem poetas, nem aqueles que vêem códigos acrósticos na Escritura que compreende a Escritura. A verdade de Deus vem via o nosso entendimento das proposições da Escrituras conforme as regras ordinárias da gramática e da lógica (que estão presentes na Escritura). Por isso, a Bíblia não contém paradoxos lógicos."[4]

A doutrina de que a Escritura é inerrante não surgiu com o movimento Fundamentalista no início do século XX. Este tão antigo ensino pode ser encontrado, com clareza, durante o escolasticismo protestante no século XVII, por exemplo, o teólogo luterano alemão Johann A. Quenstedt (1617-1688) declarou que "a Sagrada Escritura canônica no texto original é infalível verdade e livre de todo erro; em outras palavras, na sacra Escritura canônica não existe mentira, nem falsidade, nem erro mínimo qualquer, seja no assunto ou de expressão, mas em todas as coisas e em todos os detalhes que são manuseados nela, ela é a mais segura verdade, tanto no que pertence a doutrinas, ou moral, à história ou cronologia, a topografia ou nomenclatura. Nem a ignorância, nem negligência, nem esquecimento, nem lapso de memória puderam e ousaram atribuir aos amanuenses do Espírito Santo em seu registro dos Escritos Sagrados."[5] Sustentando a mesma opinião acerca da inerrância das Escrituras, o teólogo reformado suíço Francis Turrentin (1623-1678) afirmou que “os escritores sacros foram movidos e inspirados pelo Espírito Santo, envolvendo tanto os pensamentos, como a linguagem, e que eles foram preservados livres de todo erro, fazendo com que os seus escritos sejam inteiramente autênticos e divinos.”[6]

A salvação pressupõe que a humanidade perdeu a sua identidade original, tornando-se deturpada e alienada moral e espiritualmente. O ser humano não é moralmente neutro, mas inclinado a tomar decisões que refletem a sua natureza. As pessoas, no estado natural em que se encontram são movidas intuitivamente, acima de tudo, pela cobiça e pelo egoísmo. Toda a humanidade está num estado espiritual decaído, diferente daquele em que foi originalmente criada. A ética cristã reconhece que as pessoas são incapazes por si mesmas de aceitar a perfeita vontade de Deus, expressa na Escritura Sagrada, e muito menos de obedecê-la.

A explicação que a Escritura oferece da Queda é a única que esclarece o real relacionamento que o ser humano tem com Deus. O apologista Francis A. Schaeffer argumenta que existiu "um período anterior à queda, e então, o homem desviou-se do seu ponto de integração apropriado, por sua escolha; e, assim procedendo, houve uma descontinuidade moral – o homem tornou-se anormal. Remova estes fatos e a resposta cristã às questões da moral se vai. Freqüentemente encontro evangélicos levando a primeira parte do Gênesis na brincadeira. Mas o fato é que, se desprezarmos a Queda verdadeira, espaço-temporal e histórica, as respostas deixarão de existir. Não se trata apenas de uma extinção do Cristianismo histórico e bíblico, como se coloca na corrente da história, mas toda e qualquer resposta que possamos ter para o homem e o seu dilema moral, também estará extinta."[7]

A salvação dos eleitos de Deus ocorre num processo temporal: presente, passado e futuro. R.C. Sproul observa que "a Bíblia refere-se ao fato de termos sido salvos antes da criação do mundo (Ef 1:4). Nesse trecho o tempo passado foi empregado em relação à salvação no sentido mais extremo. [...] Há um sentido no qual somos ou estamos salvos. No momento em que depositamos nossa confiança em Cristo, e somente em Cristo, Deus nos declara justificados. [...] Seremos salvos, visto que aguardamos nossa salvação com Cristo e a consumação definitiva da nossa salvação."[8]

A sociedade pós-moderna experimenta a deterioração dos valores que a preserva. A falta de sentido e propósito também produz a desesperança. Esta sociedade busca a redenção na tecnologia, cultura, e no sexo, todavia, estes meios são ineficazes de transformá-la. Todavia, somente com os valores do reino de Deus, num discipulado integral, em que os cristãos se envolvem produtivamente em todas as áreas da vida, é possível participar dum processo de transformação cultural, político, econômico e científico reconhecendo Cristo como o Senhor em todas as esferas da existência humana. A sociedade pós-moderna inclina-se a não reconhecer a verdade como absoluta, ridicularizando a concepção e a ação de Deus no mundo; entretanto, os cristãos são responsáveis de construir uma sociedade influenciada pelo Evangelho de Cristo que ofereça o bem-estar a todos.

Notas:
[1] Dietrich Bonhoeffer, Discipulado (São Leopoldo, Ed. Sinodal, 1995), p. 18.
[2] John Sittema, Coração de Pastor (São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2004), p. 173.
[3] John Sittema, Coração de Pastor, p. 173.
[4] W. Gary Crampton, By Scrypture Alone (Unicoi, The Trinity Foundation, 2002), p. 78
[5] Citado em Gordon H. Clark, The Pastoral Epistles (Unicoi, The Trinity Foundation, 1998), p. 131.
[6] citado por W.G.T. Shedd, Dogmatic Theology (Nashville, Thomas Nelson Publishers, 1980), vol. 1, p. 72
[7] Francis A. Schaeffer, O Deus que se revela (São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2002), p. 74.
[8] R.C. Sproul, Salvo de quê? (São Paulo, Editora Vida, 2006), p. 23.

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