16 outubro 2006

Cosmovisão e ética

O cristianismo é uma religião em que a ética exerce uma função essencial. O trino Deus é santo, e exige um relacionamento santo, a sua verdade é absoluta, e a justiça é um elemento permanente em seu reino. Não existem decisões e relacionamentos em que não se apliquem preceitos éticos, e que não tenham motivações e implicações morais. Aceitando esta premissa podemos pensar que o cristianismo é mais do que discipulado, mais do que acreditar em um sistema de doutrinas sobre Deus. O Cristianismo genuíno "é uma maneira de ver e compreender toda a realidade. É uma cosmovisão, uma visão de mundo. [...] em toda área da vida, conhecimento genuíno significa discernir as leis e ordenanças pelas quais Deus estabeleceu a criação, e então permitir que essas leis modelem a maneira pela qual devemos viver."[1]

Toda ética é orientada por uma cosmovisão. As nossas crenças ditam o nosso comportamento, porque as idéias têm conseqüências. Em toda ação moral há uma teoria definida ou não. Uma das características exclusivas dos seres humanos é que não podem fazer nada sem um tipo de orientação ou condução que uma cosmovisão dá. Necessitam ser guiados porque são inescapavelmente criaturas com responsabilidade, que por natureza são incapazes de sustentar opiniões puramente arbitrárias ou fazer decisões inteiramente sem princípios. Por isso, é necessário escolher conscientemente uma específica cosmovisão cristã. Sem uma cosmovisão a possibilidade da incoerência é presente, tornando fragilizada qualquer postura ética que for adotada. Por isso, James W. Sire comenta que comprometer-se com uma cosmovisão “na verdade, é um passo significativo na direção da auto-conscientização, do auto-conhecimento e do auto-entendimento.”[2]

Cosmovisão é o conjunto de premissas que orientam a interpretação de toda a experiência com Deus, comigo e com o próximo. Norman Geisler observa que a cosmovisão “é um sistema filosófico que procura explicar como os fatos da realidade se relacionam e se ajustam um ao outro.”[3] Existem basicamente três provas que formam a estrutura de uma cosmovisão.[4] Primeiro, a suficiência dos pressupostos. Para o desenvolvimento de uma lógica válida, que conduzirá a um resultado que expressa a verdade, é necessário reter-se pressupostos não somente verdadeiros, mas também suficientes. Qualquer informação que falte, propiciará para um possível desvio da verdade. A cosmovisão que não tem respostas a perguntas cruciais não pode ser verdadeira.

Segundo, a consistência interna. A contradição é um caos mental. O uso da lei da não-contradição é necessário para a formação de qualquer cosmovisão. Esta lei da lógica declara que duas declarações não podem possuir sentido contrário, ao mesmo tempo e no mesmo contexto. A contradição é inerente e absurdamente incompreensível. A consistência elimina os elementos e as categorias contraditórias. A essência da verdade é a coerência, pois os fatos são complementares entre si.

Terceiro, a coerência com a experiência externa. Devemos perguntar se a cosmovisão ajusta-se aos fatos. A aplicabilidade existencial de uma cosmovisão é crucial para comprovar a sua veracidade. É necessário questionar se esta percepção da realidade é construtiva? Quais são as conseqüências práticas de se crer assim? Estas conclusões não abrirão portas para um comportamento bizarro, ou destrutivo?É importante notar que as cosmovisões têm a ver com crenças básicas sobre as coisas. As crenças básicas que uma determinada pessoa sustenta, tendem a formar uma estrutura ou padrão. Eis a razão por que os humanistas freqüentemente falam de um "sistema de valores". Todas as pessoas reconhecem, em algum grau pelo menos, que devem ser consistentes em suas concepções, se quiserem tomá-las com seriedade; de modo responsável, não adotam uma posição arbitrária de crenças básicas que não possuam coerência. A cosmovisão forma, num grau significativo, a maneira pela qual avaliamos os eventos, assuntos e estruturas de nossa civilização e da nossa época. A cosmovisão bíblica é simplesmente um apelo para que o crente leve a sério a Bíblia e o seu ensino para a totalidade da civilização, e que não a relegue a alguma área opcional chamada "religião".

Notas:
[1] Charles Colson & Nancy Pearcey, E Agora Como Viveremos? (Rio de Janeiro, CPAD, 2000), p. 33.
[2] James W. Sire, O Universo ao Lado (São Paulo, Editora Hagnos, 2004), p. 21.
[3] Norman Geisler, & Peter Bocchino, Fundamentos Inabaláveis (São Paulo, Editora Vida, 2003), p. 53.
[4] Alan Myatt, Apostila de Teologia Sistemática (texto não publicado do Seminário Teológico Batista do Sul, Rio de Janeiro, 1999), p. 2.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

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